Redação Planeta Amazônia
O Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), o Serviço Florestal Brasileiro (SFB) e a consultoria Systemiq lançam hoje (23/7), uma parceria para fomentar concessões florestais de manejo e de restauração florestal na Amazônia. A meta é chegar a 5 milhões de hectares nos próximos dois anos – área próxima ao território da Costa Rica e mais do que o triplo dos atuais 1,3 milhão de hectares sob esse regime.
A parceria tem como objetivos a realização de modelagens financeiras, estudos técnicos, apoio na distribuição de recursos das concessões para estados e municípios, incentivo à implementação de políticas voltadas ao manejo florestal comunitário e criação de materiais de comunicação sobre o tema. Ela conta com recursos do governo britânico por meio do UK PACT (Partnering for Accelerated Climate Transitions), o principal programa de combate às mudanças climáticas do UK’s International Climate Finance (ICF).
O manejo florestal permite a retirada seletiva de árvores para fins madeireiros, associada ou não à exploração simultânea de produtos não-madeireiros (como castanhas, óleos, extratos e turismo). “A restauração florestal, uma modalidade recém introduzida, será remunerada principalmente pela venda de créditos de carbono pelo concessionado”, explica Renato Rosenberg, diretor de Concessões Florestais e Monitoramento do SFB. O edital do projeto passa por aprovação do Tribunal de Contas da União para ser publicado e contará com aporte específico do BID e do BNDES. Ainda em julho, haverá também uma oitiva com o mercado sobre o edital no dia 25 de julho.
Benefícios financeiros e ambientais
As 23 concessões em vigor estão em diferentes estágios de implantação e 16 tinham iniciado a produção até 2022, ano em que a atividade arrecadou R$ 33,5 milhões em produtos madeireiros (400 mil metros cúbicos de tora), segundo dados do SFB. Com a expansão, em 2026 esses números saltarão para 1,8 milhão de metros cúbicos de tora, com valor de R$ 184 milhões.
Atrelado a esse desempenho, está a geração de cerca de 7 mil empregos diretos e 14 mil postos de trabalho indiretos, além de investimentos sociais da ordem de R$ 15 milhões. Some-se ainda uma arrecadação pública em torno de R$ 45 milhões – parte da qual é distribuída aos estados e municípios que sediam as florestas concessionadas. “Hoje, existe um repasse de R$ 14 milhões derivados de concessões federais apenas para o estado do Pará. E alguns municípios superam a cifra de R$ 3 milhões. Para calcular o impacto desse ganho, basta lembrar que estamos falando de localidades com os menores IDHs do país. O desafio é destravar o uso desse recurso para que ele se converta em benefícios para as comunidades onde estão inseridos”, considera Leonardo Sobral, diretor Florestal do Imaflora.
Há outro ganho fundamental: a conservação das florestas e de sua biodiversidade. “O manejo florestal obedece a parâmetros rigorosos, com volume máximo de extração por hectare e ciclos de 30 anos para recomposição da floresta. A atividade faz com que o território beneficiado deixe de ser terra de ninguém, como acontece com a maioria das florestas não destinadas, ou seja, aquelas que não são terras indígenas, reservas ou unidades de conservação”, continua Sobral.
Na opinião de Felipe Faria, diretor da área de Natureza da Systemiq, a inclusão do mercado de carbono nessa agenda, combinada com o manejo e a restauração florestal em escala, representa um avanço significativo, oferecendo novas oportunidades de financiamento e incentivo à preservação da floresta. “Consideramos a valorização da floresta em pé uma estratégia central e acreditamos que, ao fornecer essas novas ferramentas econômicas, criamos as bases para um desenvolvimento sustentável, que beneficiará tanto as comunidades locais quanto o meio ambiente global. Juntos, podemos transformar a conservação da Amazônia em um modelo de prosperidade econômica e ambiental”, afirma.
Quebrar o ciclo do desmatamento e da ocupação ilegal é uma questão econômica: a floresta precisa valer mais em pé do que derrubada. “Seguramente, o manejo florestal é o melhor exemplo de atividade econômica desenvolvida em escala capaz de proteger a floresta e, ao mesmo tempo, fomentar emprego, renda, oportunidades sociais e formalização da economia. Essa agenda conta com um histórico de bons resultados, mas precisamos acelerá-la”, assinala Rosenberg.
Produzir para conservar
Pode parecer estranho que a permissão para o corte de árvores funcione como um mecanismo de proteção da floresta em pé. Mas é exatamente o que acontece. As operações de concessão requerem planos de manejo minuciosos na descrição do que será extraído e onde. Elaborado antes do início da operação, esse plano é precedido por um inventário, que permite saber o estoque de espécies.
Tipicamente, um hectare de floresta tropical possui cerca de 200 árvores adultas e outras 1.000 árvores jovens. No manejo, é permitido o corte de cinco a seis árvores por hectare, a cada ciclo de 30 anos. Esse corte é planejado e seletivo – exclui espécies protegidas, como a castanheira; as árvores mais velhas, que funcionam como matrizes porta sementes; e as mais jovens, ainda em crescimento. Nunca são tirados todos os indivíduos de uma mesma espécie, o que assegura a manutenção da diversidade.
Nas três décadas seguintes ao corte, a área irá cicatrizar. Registros precisos de imagem mostram que, em cerca de dez anos, a floresta está quase toda recomposta, incluindo áreas de estradas secundárias, que foram abertas para a extração. Daí, são mais vinte anos de recuperação, sem afetar a biodiversidade nem os chamados serviços ambientais de captação hídrica e captura de carbono, fundamentais para o equilíbrio climático.
Mecanismos de controle
O SFB utiliza um sistema de cadeia de custódia, que reúne diferentes procedimentos para se certificar de que a operação está cumprindo o plano de manejo. Cada tora cortada recebe um QR Code, que mostra suas principais características – espécie, dimensões e localização no plano –, como uma digital daquela árvore. Aliado a isso, há a Detecção de Exploração Seletiva (Detex), metodologia desenvolvida em conjunto com o Inpe, que utiliza satélite para verificar, quinzenalmente, se há degradação superior ao planejado ou fora do plano.
Paralelamente, são usados drones nas verificações de volume de madeira nas fases de corte, transporte, processamento e venda. O objetivo é se certificar de que não haja discrepâncias. Se alguém vender ou transportar uma quantidade superior à que cortou, por exemplo, pode ser sinal de madeira ilegal embarcada no lote. Por fim, emprega-se um sistema por radar, chamado Light Detection and Ranging (Lidar), de grande precisão no acompanhamento da recomposição da floresta após os cortes.
Fim da ilegalidade
A agenda de concessões pode ser fortemente alavancada, para que a floresta amazônica não continue sofrendo com a devastação. Calcula-se que 25 milhões de hectares sob regime de manejo florestal permanente bastariam para acabar com a ilegalidade no setor madeireiro.
Embora pareça irrealizável, o número corresponde a menos da metade dos 60 milhões de hectares de florestas públicas (federais e estaduais) sem destinação hoje, as mais vulneráveis a crimes ambientais. Segundo o Imaflora, o cálculo tem como base a área necessária para a produção anual do equivalente a toda madeira legalmente comercializada no país, em torno de oito a dez milhões de metros cúbicos ao ano.
A plataforma Timberflow – desenvolvida pelo Imaflora para orientar compradores de madeira, dentre outros fins – demonstra que, no período de 2010 a 2023, foram produzidos 77 milhões de metros cúbicos de madeira, 8% dos quais para exportação.
Embora cerca de mil espécies sejam exploradas comercialmente, oito respondem sozinhas por 50% das exportações. São elas: ipê, tauari, maçaranduba, jatobá, angelim vermelho, garapeira, cumaru e tauari vermelho. “A concentração da demanda em algumas espécies sinaliza pressão sobre elas e, mais uma vez, o regime de concessões e de restauração florestal pode ser um aliado, ao melhorar o planejamento para utilização equilibrada dessas riquezas”, finaliza Sobral.
Sobre o Imaflora
Desde 1995, atua na promoção do uso sustentável e inclusivo dos recursos naturais. Seus projetos conciliam conservação ambiental e desenvolvimento econômico, atendendo a demandas das cadeias florestal, agropecuária, da sociobiodiversidade e da agenda climática. Realiza trabalho em campo, assistência técnica, serviços ESG e certificações, além de pesquisa e desenvolvimento de dados.
Sobre a Systemiq
Fundada em 2016, tem como missão impulsionar a realização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e do Acordo de Paris, transformando mercados e modelos de negócios em cinco sistemas principais: natureza e alimentos, materiais e circularidade, energia, áreas urbanas e finanças sustentáveis. A Systemiq combina consultoria estratégica com trabalho de alto impacto, estabelecendo parcerias com empresas, setor público, financiadores e sociedade civil para promover mudanças sistêmicas. A empresa está presente no Brasil, França, Alemanha, Indonésia, Holanda e Reino Unido.