COP 30: Belém não pode ser apenas uma vitrine de “boas intenções”

Luciana Sonck (*)

Enquanto a preparação logística para a COP 30 em Belém ocupa as manchetes nacionais — e, sem dúvida, é um tema de grande relevância — ainda não sabemos qual será a temática da primeira conferência das partes amazônica. Em geral, as COPs são definidas por temas centrais, que direcionam as discussões e a tomada de decisões. A COP 29, por exemplo, em Baku, no Azerbaijão, teve como foco o financiamento climático, mas não conseguiu alcançar os resultados esperados. Faltando poucos meses, ouvir Belém ser chamada de “COP da ação” é, no mínimo, vago.
 

A natureza de uma COP é essencialmente governamental, isto é, concentrando-se principalmente nas áreas azuis (blue zones), onde os acordos entre líderes são negociados. No entanto, com o aumento da presença de empresas, negócios de impacto e organizações da sociedade civil, as áreas verdes (green zones) têm ganhado cada vez mais espaço e relevância. Vale destacar que as COPs, por sua própria estrutura, não foram pensadas para envolver a participação social de forma ampla. No entanto, o Brasil, seguindo o exemplo de eventos como o G20 Social, a Rio+20 e a histórica Eco 92, tenta envolver, abrir caminhos para a participação social, desde grupos de engajamento com pautas transversais, como igualdade de gênero e racial, até a realização dos eventos.
 

A governança adotada no G20 Social, teve impacto positivo e por isso será replicada pela presidência da África do Sul em 2025, mostrando que, com esforço contínuo e aprimorado, é possível criar soluções que incluam as populações locais e suas demandas específicas. Porém, o risco da ampliação das vozes sem um processo de regulação dos presentes nas discussões pode ter seus revés, como a crescente presença de representantes de setores empresariais como o de combustíveis fósseis, que buscam acordos comerciais pouco ou nada relacionados à crise climática e que distanciam cada vez mais as chances de conseguirmos limitar o aquecimento global a 1,5°C.
 

Dentro desse complexo cenário como garantir que a inclusão seja efetiva também na COP 30 para não ser apenas uma vitrine de boas intenções e ser, de fato, a COP da ação?
 

A Conferência das Partes de 2025 será a primeira a ser realizada em um país amazônico, e povos indígenas de toda a Pan-Amazônia, quilombolas, ribeirinhos, comunidades tradicionais e movimentos sociais têm o direito e o dever de estar presentes. Até porque, conforme a legislação, são soberanos em seus territórios. Diversas análises estão sendo promovidas com o slogan “de Baku a Belém”, incentivando a ação.

Mas que ação é essa, se ainda não sabemos como incluir essas pessoas de forma real no processo da COP?

Ainda que esse movimento exista, percebemos como essas vozes estão inseridas por vezes de forma figurativa na conferência, tendo pouco ou nenhum papel decisório. Sem mencionar os impactos para Belém, sede do evento, onde ficam dúvidas sobre o legado deixado para a cidade e outros municípios paraenses, em termos de infraestrutura, educação e cultura que beneficie efetivamente os moradores e não apenas tenham atrapalhado – por anos – a cidade com obras exclusivas para a sua realização. Muito além da magnitude do evento de duas semanas que receberá os principais líderes globais, é preciso pensar em como ele se refletirá de forma prática para a população.
 

Infelizmente esse não é um problema novo. Acompanho de perto a dinâmica desses grandes eventos multilaterais, públicos e privados ao longo dos anos e não apenas nos eventos, mas também na implementação de projetos e, desta forma, vi que a mudança real só ocorre quando todos os envolvidos são atuantes no processo. Por isso, um dos caminhos para a inclusão efetiva parte inicialmente da conscientização, politizando as comunidades locais desde o início do processo, para uma vez munidos de ferramentas possam , dialogar com os territórios e seus parceiros, amplificando as vozes locais e identificando os desafios de forma colaborativa, buscando articular os conflitos e interesses das partes. A partir daí, se avança para a construção, e cocriação de soluções sustentáveis e adaptadas à realidade local, com a participação dos atores institucionais, territoriais e governamentais.
 

É a partir de um processo participativo que consolidamos soluções que podem garantir uma continuidade. Ao fortalecer as estruturas locais de governança, asseguramos que as mudanças iniciadas sejam mantidas e ampliadas pela própria comunidade.
 

O desenho da COP 30 deveria seguir este curso: politizar o local, dialogar com a população anfitriã, amparar o desenho dos objetivos da conferência por meio de metodologias estruturadas que garantam equidade e construção de redes de governança locais que carreguem seu legado após a sua realização em novembro deste ano. O Brasil tem pautas urgentes como país que podem orientar o tema central da COP 30: adaptação climática, políticas para cidades resilientes e, cada vez mais, a transição energética justa.
 

Independentemente do tema, a COP de Belém não pode ser um evento focado apenas em impressionar o público internacional; ela deve refletir o verdadeiro desejo de participação dos brasileiros, especialmente dos amazônidas, que precisam ser protagonistas no processo. A última coisa que queremos reproduzir é mais uma conferência com atores dotados de capital político e econômico do lado de dentro e a população amazônida do lado de fora. O momento de ouvir as partes e garantir que as soluções levem em conta as realidades do Brasil é agora.

(*) mestra em planejamento territorial e especialista em governança

By emprezaz

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