Especialistas propõem modelo de governança climática ao Brasil

Redação Planeta Amazônia

Apesar de registrar experiências de políticas ambientais bem sucedidas, o país que vai sediar a COP30 ainda não dispõe de um sistema robusto com mecanismos, estruturas e políticas climáticas bem definidos. A governança ancorada nos anos 2000, quando a magnitude dos impactos climáticos era outra, requer atualização adequada às atuais demandas e ambições brasileiras – tanto na agenda de mitigação de emissões de GEE quanto na adaptação a um mundo mais quente.

Para contribuir, o Instituto Talanoa se uniu ao Centro de Estudos de Administração Pública e Governo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) para avaliar os instrumentos institucionais empregados, identificar os principais obstáculos e propor um sistema de governança climática ao Brasil. Os especialistas recomendam um modelo mais colaborativo, mais federativo e que agregue às capacidades estatais de formulação e implementação a articulação entre os atores que podem influenciar e impactar na resolução do problema.

O resultado dos estudos e a proposta de um modelo inédito de governança climática para o Brasil serão conhecidos na próxima quarta-feira (16), a partir das 9h, na sede da FGV em São Paulo. A presidente do Instituto Talanoa, Natalie Unterstell, e o coordenador da pesquisa, professor Fernando Abrucio, da FGV, vão apresentar o diagnóstico e propor soluções em evento aberto ao público. Na ocasião, o tema também será debatido em painel com representantes do governo e da sociedade civil.

Modelo ideal: das falhas à solução

A falta de clareza na distinção entre ambiental e climático é equivocada e interfere no ciclo das políticas públicas que incidem no tratamento da emergência climática. É preciso que a gestão pública assuma que “a política climática transcende o tema ambiental, que deve ser lido como pano de fundo”, argumenta o relatório. É ainda vital compreender e abordar a agenda climática a partir de um olhar intersetorial e transversal, uma vez que os impactos do aquecimento global são sentidos em todas as dinâmicas sociais – da saúde à educação; do urbanismo à cultura.

A agenda climática é caracterizada por problemas complexos, que envolvem múltiplas causas, dinâmicas não lineares, com envolvimento de variados atores e instituições, o que dificulta uma tomada de decisão mais ágil e eficaz. Por essa razão, a proposta aponta para um modelo de Governança Colaborativa, “que deve ser entendida como um arranjo em que as instituições públicas e as partes interessadas se envolvem diretamente, conduzindo um processo de tomada de decisão coletiva, formal, deliberativo e orientado ao consenso”, defendem.

“Estamos estudando e propondo um novo modelo baseado no diálogo porque o que temos hoje ainda segue uma lógica centralizada, que não responde à altura nem a velocidade das demandas locais e não estimula que soluções colaborativas emerjam dos diversos setores sociais que podem e devem contribuir”, comenta a presidente da Talanoa, Natalie Unterstell. Segundo a proposta construída pela Talanoa e pela FGV, “não será possível resolver os desafios da política climática apenas pela via dos atores estatais, só que esse processo precisa ser institucionalizado, para além das relações informais que marcam esse setor”, aponta o relatório.

Além de colaborativa e orientada para o diálogo e o consenso, a organização das políticas climáticas brasileiras deve estar fundamentada na construção de um robusto triângulo de legitimidade e efetividade, com interconexão entre os aspectos técnicos, políticos e sociais. Para isso, o modelo ideal deveria compor um Sistema Nacional, com forte coordenação federal para estabelecer os eixos nacionais e as formas de articulação com os governos subnacionais sem que haja distração da dimensão internacional, que é central na política climática – em nível muito mais evidente do que a maioria das políticas públicas.

Uma das principais recomendações da proposta elaborada por Talanoa e FGV é que o governo brasileiro crie uma Autoridade Climática com autonomia para coordenar as políticas públicas. Idealmente a liderança teria poder federal, exercício independente dos mandatos e funcionaria como uma espécie de agência reguladora, passível de fiscalização de instrumentos de accountability, tanto políticos quanto sociais. Ou seja, a estrutura destinada à autoridade climática também estaria sujeita ao sistema de pesos e contra-pesos característico das democracias, tendo transparência e prestação de contas como pilar fundamental. Esse organismo funcionaria em sintonia com comitê técnico permanente que pudesse respaldar as decisões. “Teria o papel de fazer a ponte entre o imediato e o longo prazo, entre o político e o técnico, sendo mais a guardiã das metas estabelecidas legalmente e a defensora dos diagnósticos técnicos, enquanto caberia aos gestores governamentais, subordinados aos políticos eleitos, a viabilização desses objetivos e a montagem dos meios necessários para se alcançar o sucesso das políticas públicas”, descreve o texto do relatório.

Por compreender que as mudanças climáticas são uma questão intrinsecamente multinível e que o Brasil possui um território complexo, com variedade de biomas, culturas e desafios característicos de cada localidade, a governança climática proposta deve estabelecer modelos regionalizados, com ações intermunicipais e interestaduais. É necessário ainda que mecanismos institucionais sejam criados para que as ações subnacionais sejam coordenadas, induzidas e monitoradas, garantindo uma implementação que combine o padrão nacional às necessidades territoriais específicas. Já o Sistema de Justiça e os órgãos de controle teriam o papel de apoio com o corpo técnico e, sobretudo, esforço para aumentar a aplicaçãodas normas climáticas em todo o país.

Proposta fundamentada em pesquisa

Com a missão de propor um modelo sintético de Governança Climática no Brasil, tendo como ponto central a construção de um desenho sistêmico e colaborativo de política pública, os pesquisadores da FGV apresentaram quatro relatórios sob medida ao Instituto Talanoa, sendo que três deles trazem o diagnóstico da governança brasileira, desde as políticas públicas – de maneira genérica – até a especificidade da governança em políticas ambientais e, por fim, o vácuo quanto às ações coordenadas para crise do clima. Os estudos também consideraram inspirações internacionais para dimensionar a complexidade da governança climática no Brasil, tendo em vista a amplitude de seu território, variedade de biomas, além da diversidade social. Os relatórios devem dar origem a publicações que serão anunciadas na próxima etapa do projeto.

By emprezaz

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