Redação Planeta Amazônia
A biodiversidade da Amazônia está no centro de uma transformação silenciosa na biotecnologia brasileira. Em laboratórios e tanques de cultivo espalhados pela região, microalgas isoladas de rios amazônicos estão sendo convertidas em insumos de alto valor para cadeias produtivas como a pecuária, a aquicultura e o setor de suplementos alimentares. O objetivo é gerar riqueza sem desmatamento, aproveitando o potencial natural da floresta para atender a uma demanda global crescente por alternativas sustentáveis.
Ricas em proteínas, ácidos graxos e antioxidantes, as microalgas prosperam em ambientes aquáticos e têm se mostrado estratégicas para a bioeconomia amazônica, com aplicações que vão de bioinsumos agrícolas a suplementos nutricionais e cosméticos. “O cultivo de microalgas demanda pouca área física e pode ser realizado em tanques ou biorreatores, aproveitando estruturas já existentes. Isso abre caminho para uma produção escalável e de baixo impacto ambiental”, explica Fabiane Almeida, CEO da Aqua Viridi, startup que trabalha com cepas amazônicas isoladas do Rio Negro.

A Aqua Viridi, apoiada pela Jornada Amazônia — plataforma que conecta startups da bioeconomia a investidores e grandes empresas —, desenvolveu um blend de microalgas ricas em ômega-3 para uso em rações animais. O composto ajuda a reduzir inflamações, fortalecer o sistema imunológico e aumentar o crescimento e a sobrevivência de espécies como peixes e camarões.
A substituição de insumos tradicionais, como farinha e óleo de peixe, por microalgas cultivadas localmente pode reduzir a dependência de importações e minimizar impactos ambientais. Os produtos também têm aplicação em processos de biorremediação, usados para tratar poluentes em solo, água e ar. “Usar cepas locais, adaptadas ao ecossistema da floresta, garante não apenas performance nutricional, mas também uma conexão real com o território”, acrescenta Fabiane, doutora em Biologia de Água Doce e Pesca Interior pelo INPA.


Outra iniciativa que se destaca é a Tamü, startup que cultiva spirulina amazônica para produção de suplementos alimentares. Considerada um superalimento, a spirulina contém cerca de 70% de proteína, além de vitaminas do complexo B, ferro e magnésio. Fundada por pesquisadores que decidiram transformar conhecimento científico em soluções de mercado, a empresa usa substratos amazônicos no cultivo, garantindo um processo mais sustentável e com propriedades nutricionais diferenciadas. “Encontramos na bioeconomia a chance de unir inovação, biodiversidade e saúde em um mesmo propósito”, afirma Thyago Gatto, fundador da Tamü.
Os suplementos têm ganhado espaço entre atletas e consumidores interessados em alimentação natural e funcional. A startup também aposta na reciclagem de subprodutos locais e na redução da pegada de carbono em toda a sua cadeia produtiva.

Potencial e desafios
Apesar dos avanços, escalar a produção de microalgas ainda é um desafio. O setor demanda infraestrutura especializada, capital de risco e soluções logísticas adaptadas à realidade amazônica. A complexidade regulatória e a ausência de incentivos fiscais específicos para bioinsumos também dificultam a expansão.
Mesmo assim, o cenário é promissor. A demanda global por insumos naturais e rastreáveis está em crescimento, impulsionada pelos setores de nutrição, cosméticos e agricultura regenerativa.
“As startups da bioeconomia amazônica têm mostrado que inovação e conservação podem caminhar juntas”, destaca Janice Maciel, coordenadora executiva da Jornada Amazônia. Segundo ela, a plataforma já apoiou mais de 300 negócios por meio dos programas Gênese, Sinapse Bio, Sinergia e Sinergia Investimentos. “Ainda enfrentamos gargalos de infraestrutura e regulação, mas o avanço dessas iniciativas prova que a bioeconomia é uma das maiores oportunidades de desenvolvimento sustentável do Brasil.”

