Mais da metade do carbono orgânico armazenado no solo brasileiro está na Amazônia

Redação Planeta Amazônia

O Brasil possui uma massa total de 37,5 gigatoneladas (Gt) de carbono orgânico do solo (COS) na camada de 0 a 30 centímetros, com uma média de 44,1 toneladas por hectare (t/ha). Mais da metade (52%) desse total está na Amazônia. Estes são alguns dos novos dados do MapBiomas Solo. Desenvolvida pela rede MapBiomas, a plataforma integra dados da nova Coleção 3 (beta) de mapas anuais do estoque de carbono orgânico do solo entre 1985 e 2024, além de mapas de granulometria, textura e profundidade de camadas pedregosas dentro de 100 centímetros do solo em todo o território brasileiro. Todas as informações estão disponíveis gratuitamente no site Link a partir de 5 de dezembro, celebrado como o Dia Mundial do Solo.


“O solo é um arquivo do tempo: nele se acumulam sinais de clima, vegetação e relevo que moldaram o território ao longo da história. A distribuição do carbono orgânico é um exemplo disso. Compreender esses padrões é olhar para o país também pelo que se conserva abaixo da superfície”, explica o professor Alessandro Samuel-Rosa, um dos coordenadores do MapBiomas Solo. “Esses mapas das propriedades dos solos brasileiros, como carbono, textura e pedregosidade, permitem avanços nas análises voltadas aos usos agrícolas e urbanos do solo, como o armazenamento de água, susceptibilidade a processos erosivos e movimentos de massa, a avaliação de riscos climáticos e o planejamento territorial”, completa a professora Taciara Zborowski Horst, que também coordena a iniciativa.


Os dados revelam que 35,9% do solo brasileiro estoca entre 40 e 50 t/ha de carbono. A Mata Atlântica supera a média nacional de armazenamento por hectare, com 53,4 t/ha, onde se encontram as regiões de clima mais frio (como campos de altitude e florestas de araucária) e úmidas (como restingas e mangues) que favorecem o acúmulo de carbono abaixo da superfície. Em segundo lugar, está a Amazônia, com 46,3 t/ha, e depois o Pampa, com 43,7 t/ha. Nos dois biomas, os maiores estoques de carbono orgânico do solo estão em florestas de várzea, como aquelas próximas do Rio Negro na Amazônia, e na zona costeira.


A relação entre composição do solo e uso da terra


Para fins práticos, a composição do solo é usualmente agrupada em classes de textura, que refletem a relação entre areia, silte e argila. Os novos dados mostram que, na camada superficial de 0–30 cm, a textura média predomina em 63,4% do território brasileiro, seguida pelos solos argilosos (29,6%), enquanto as classes arenosa, siltosa e muito argilosa somadas representam apenas 7% da área nacional. Além das diferenças na superfície, os mapas permitem observar de maneira explícita como a textura do solo pode mudar em profundidade: entre 60 e 100 cm, o país se torna majoritariamente argiloso (63,6%).


A textura do solo brasileiro revela contrastes marcantes entre os biomas brasileiros. Na Mata Atlântica, predominam solos com teores de argila superiores a 60%, o que confere maior capacidade de armazenamento de água e de retenção de nutrientes e também contaminantes, além de permitir que o carbono orgânico permaneça estocado por longos períodos. Em contraste, Cerrado, Caatinga e Pantanal concentram áreas com teores de areia acima de 60%, ou seja, em solos nos quais a capacidade de retenção de nutrientes e carbono são menores e a infiltração e evaporação da água ocorrem de forma mais rápida, refletindo em menor quantidade de água disponível no solo. Ao mesmo tempo, a facilidade de infiltração contribui para a recarga dos aquíferos durante o período chuvoso. Já os maiores teores de silte, geralmente inferiores a 30%, ocorrem sobretudo nas várzeas da Amazônia, associados a sedimentos transportados dos Andes pelos grandes rios que alimentam o sistema amazônico, onde também se acumulam grandes quantidades de carbono.


“Os dados ajudam a explicar por que diferentes ambientes respondem de maneiras distintas ao uso do solo e às condições climáticas. Por exemplo, a mudança da textura em profundidade pode ter efeitos distintos dependendo da cobertura ou uso da terra. Quando sob vegetação natural, cultivo perene ou com cobertura do solo abundante, ela pode aumentar a disponibilidade de água da chuva que infiltra lentamente no solo. Por outro lado, em solos descobertos, revolvidos ou com vegetação rala, a mudança textural tende a dificultar a infiltração e aumentar o risco de erosão do solo. Esse efeito aumenta, com eventos de precipitação extrema”, explica o professor Alessandro.


A análise conjunta desses mapas de solo e da série histórica de uso e cobertura da terra evidencia padrões de ocupação do território relacionados às características físicas do solo. Entre 1985 e 2024, a pastagem se expandiu principalmente sobre solos de textura média e arenosa, perdendo área nas regiões muito argilosas. Essas áreas foram majoritariamente ocupadas pela agricultura, que também cresceu preferencialmente sobre áreas com baixa pedregosidade nos primeiros 90 cmJá a silvicultura teve expansão mais expressiva em locais onde a pedregosidade aparece nas camadas superficiais (<50 cm). “Nos solos mais pedregosos, em que a agricultura encontra limitações, espécies florestais com sistemas radiculares mais robustos conseguem explorar o ambiente com maior eficiência. Já os solos mais rasos ainda são majoritariamente ocupados com pastagem.”, explica a professora Taciara.


Os novos dados mostram que 9% do território brasileiro (77 milhões de hectares) possuem solo com mais de 50% de seu volume ocupado por pedregosidade dominante nos primeiros 100 cm. Destes, em 27,6 milhões de hectares (3,2% do território), o solo tem, no máximo, cerca de 90 cm de profundidade. Abaixo dessa profundidade, o solo encontra a rocha ou tem mais de 90% de seu volume ocupado por fragmentos de rocha, cascalho, nódulos ou concreções (pedregosidade extrema). Na Caatinga, em particular, o solo se torna progressivamente mais pedregoso a profundidades entre 10 e 50 cm. Quanto maior a pedregosidade do solo, menor tende a ser o espaço disponível para o crescimento das raízes e o armazenamento de água, além de dificultar a mecanização agrícola e obras urbanas de saneamento.


A relação entre textura do solo e estoque de carbono


As diferenças nos estoques de carbono orgânico do solo tornam-se ainda mais evidentes quando analisadas por textura. Em média, solos argilosos, muito argilosos e siltosos possuem os maiores estoques, frequentemente acima de 50 t/ha em todos os biomas, enquanto os solos arenosos têm estoque médio de 32 t/ha no país. Na Caatinga, por exemplo, solos muito argilosos têm em média o dobro do estoque de carbono de solos arenosos, chegando a 35 t/ha de diferença.


“No Brasil, a distribuição do estoque de carbono orgânico do solo é marcadamente heterogênea, refletindo a diversidade climática, hidrológica, geológica e ecológica do território. Essa heterogeneidade reforça a importância de compreender cada bioma em sua totalidade, considerando tanto o que ocorre acima quanto abaixo da superfície”, destaca o professor. “A integração dessas camadas, todas em alta resolução, oferece um panorama detalhado da variação horizontal e vertical do solo em todo o território brasileiro. Sendo a primeira vez que esses padrões podem ser observados de forma integrada em escala nacional, confirmando tendências que antes apareciam apenas em estudos locais”, conclui Taciara.


Repositório público de amostras de solo


Além do lançamento de novos mapas de propriedades do solo, o MapBiomas Solo também lançou uma plataforma inédita de visualização espacial de dados de amostras de solo. A plataforma (https://plataforma.soildata.mapbiomas.org/) permite ao usuário navegar pelo território brasileiro, identificar onde há amostras de solo coletadas por pesquisadores e técnicos no passado e descarregar esses dados para uso em suas atividades. O usuário encontra dados de textura do solo (argila, silte e areia), carbono orgânico, densidade do solo e volume de fragmentos grossos de mais de 45 mil amostras de 15 mil pontos de coleta.


A plataforma faz parte do SoilData (https://soildata.mapbiomas.org/), o maior repositório público e de acesso aberto de dados de pesquisa em solos realizados no país. “Trata-se de um recurso único para pesquisadores, gestores públicos, consultores e produtores rurais, que agora podem localizar rapidamente dados de referência, verificar lacunas de monitoramento e comparar resultados de diferentes regiões”, explica o professor Alessandro, coordenador do repositório. E conclui. “A missão do SoilData é salvaguardar e preservar os dados da pesquisa em solos realizada no Brasil, assegurar o reconhecimento dos autores e facilitar o reuso das informações”.

By emprezaz

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