Redação Planeta Amazônia
Cerca de 120 mulheres que trabalham na atividade extrativista de cacau e cupuaçu nativos da floresta Amazônica, no Amapá, vão ter, em breve, a chance de transformar as partes dos frutos que viram lixo orgânico com alto potencial de degradação ambiental, em matéria prima para um novo produto.
Na rotina das trabalhadoras que fazem parte da Associação das Mulheres Produtoras Agroextrativistas da Foz do Mazagão Velho (Ampafoz), as cascas dos frutos são descartadas e o processo acaba resultando em toneladas de rejeitos lançadas todos os anos aos pés dos cacaueiros e cupuazureiros, provocando desequilíbrio no solo e na fauna amazônicos. Uma iniciativa, porém, quer transformar esta realidade e agregar ainda mais valor ao trabalho dessas extrativistas, com o uso da tecnologia e da inovação a serviço da sustentabilidade. O projeto pretende transformar o rejeito do cacau e do cupuaçu em fibras sustentáveis para produção de um biotecido amazônico.
A ideia, ainda que a longo prazo, é que seja instalada uma planta fabril na própria comunidade para que o produto possa ser confeccionado no local. Existe a expectativa de que o alto apelo sustentável e social do projeto possa atrair a atenção de grandes grifes nacionais que venham a se tornar parceiras do projeto.
A proposta é apoiada pela Embrapii (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial) e pelo BNDES, com desenvolvimento tecnológico pela Unidade Embrapii do Instituto Senai de Inovação em Biossintéticos e Fibras do Senai CETIQT (Centro de Tecnologia da Indústria Química e Têxtil), e partiu da empresa Urubatan Piatã Produtos da Floresta, que tem sedes no Rio de Janeiro e no Amapá.
Impacto social
Para a presidente da Associação, Rosilda do Socorro Viana Pacheco, o projeto vai muito além porque não resolve apenas o impacto ambiental da cadeia produtiva mas, vai gerar renda e qualidade de vida para as associadas e para todas as 600 famílias que vivem na mesma comunidade. “Nós vivemos do extrativismo de modo geral e com essa nova tecnologia poderemos aproveitar o grande desperdício que ocorre com o rejeito das cascas. Com certeza vai ser de muita importância, vai melhorar muito a vida das mulheres daqui. Aquilo que hoje a gente deixa como lixo para decomposição vai gerar renda para as nossas famílias”, comemora.
O biotecido amazônico é um dos 362 projetos apoiados pela Embrapii na área de bioeconomia. Deste total, 175 contratos já foram concluídos e resultaram em 92 pedidos de propriedade intelectual. Juntas, as pesquisas já alavancaram R$ 369 milhões em investimentos entre recursos da organização, empresas e Unidades que compõem a Rede MCTI (Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação)/Embrapii de Inovação em Bioeconomia.
Foco na região Norte
Projetos na área de bioeconomia, que transformam realidades sociais e geram renda de forma alinhada com a agenda da sustentabilidade, são uma tendência no Brasil. Eles são um dos focos do programa Inova+, uma parceria entre a Embrapii e o BNDES para apoiar o desenvolvimento de projetos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) em sete áreas estratégicas: bioeconomia, transformação digital, novos combustíveis, economia circular, defesa, materiais avançados e tecnologias para o Sistema Único de Saúde (SUS).
Além de atender às demandas desses setores, o Inova+ visa promover desenvolvimento tecnológico no Norte do país, com foco na inovação sustentável. Para isso, o programa tem condições diferenciadas de contratação para as empresas localizadas nos estados da região, sendo que, independentemente da receita operacional, elas podem receber até 50% do valor dos contratos em recursos não reembolsáveis.
“O Brasil é um país com enorme potencial para desenvolvimento de projetos de tecnologia em sustentabilidade e bioeconomia. A Embrapii acredita nisso e a expectativa é que possamos ampliar neste ano a contratação de projetos de inovação sustentável, em função de demandas setoriais em todo país e, mais especificamente, na região Norte”, destaca o presidente interino da Embrapii, Igor Nazareth.
A Embrapii já apoiou 35 empresas da região Norte do país no desenvolvimento de um total de 52 projetos de inovação tecnológica. Destes, 15 estão concluídos e resultaram em oito pedidos de propriedade intelectual. O investimento alavancado chegou a R$ 89,13 milhões.
Novas unidades
Para ampliar os projetos de inovação na região Norte, a Embrapii credenciou mais quatro institutos de pesquisa como Unidades Embrapii: Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), Universidade Federal do Pará (UFPA), Universidade Federal do Tocantins (UFT), e Instituto Senai de Inovação (ISI) do Pará. Juntas, elas receberão um investimento de R$ 9,6 milhões.
O credenciamento foi publicado em dezembro de 2022 e foi realizado por meio de parceria entre a Embrapii, o BNDES e o Ministério da Educação (MEC). “A ação foi desenhada para trabalhar com as características da indústria e do potencial econômico da região. Essa iniciativa se complementa à presença da Embrapii no Norte, que já tinha duas Unidades em Manaus, mas dessa vez com o foco específico em sustentabilidade”, disse Marcela Mazzoni, Gerente de Novos Programas e Parcerias Estratégicas da Embrapii.
O credenciamento é o que permite ao centro de pesquisa a inserção no ecossistema Embrapii de inovação e, assim, possa impulsionar o desenvolvimento de tecnologias apoiadas com recursos não reembolsáveis. Com isso, a região ganha reforço técnico para novos projetos de pesquisa.
Outros projetos
Entre as pesquisas de bioeconomia florestal apoiadas pela Embrapii e o BNDES, por meio do programa Inova+, está um projeto, iniciado em setembro de 20022, que prevê a produção dos extratos proteicos da torta de cupuaçu e torta de castanha do Brasil para aplicações alimentícias. A proposta partiu da parceria entre Cooperativa Reca (Reflorestamento Econômico Consorciado e Adensado), localizada em Nova Califórnia (RO) e, além do apoio da Embrapii, possui recursos do Fundo JBS pela Amazônia.
A Reca realiza extração de óleo de castanha do Brasil e de manteiga do cupuaçu e vende para a indústria de cosméticos. O processo de extração gera um montante alto de resíduos, chamado de “torta”, que atualmente é 100% rejeitado. O desafio apresentado pelos parceiros é o desenvolvimento de uma tecnologia capaz de garantir viabilidade financeira no aproveitamento das tortas de castanha do Brasil e do cupuaçu como potencial fonte de proteínas. A ideia é que, quando entre na fase comercial, o produto comercial possa ser vendido para a indústria alimentícia. O projeto recebeu aporte total de R$ 496 mil, entre recursos da Embrapii, unidade e demais parceiros.
Entre as empresas com pesquisas em andamento também está a Brazbio, pertencente ao grupo Centroflora. Com recursos do Inova+ e apoio tecnológico da Unidade Embrapii ISI Química Verde, a pesquisa busca o fortalecimento da cadeia produtiva do jaborandi e maximização da produção da pilocarpina, um composto bioativo usado na indústria farmacêutica especialmente em medicamentos oftalmológicos. O projeto que une bioeconomia e saúde está alinhado com os princípios de ESG – Environmental, Social, and Corporate Governance; no português Governança Ambiental, Social e Corporativa.
Sobre a Embrapii
A Embrapii é uma organização social que atua em cooperação com instituições de pesquisa, públicas ou privadas, para atender ao setor empresarial, com o objetivo de fomentar inovação na indústria. Para isso, conecta pesquisa e empresas, e divide riscos, ao aportar recursos não reembolsáveis em projetos que levem à introdução de novos produtos e processos no mercado. Para ter acesso ao modelo, a empresa deve apresentar seu desafio tecnológico à Unidade com a competência técnica que se enquadra às necessidades de seu projeto. A Embrapii possui contrato de gestão com o Governo Federal, por meio dos Ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação, da Educação, da Saúde e do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.