Pelo período de um ano, cientistas do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI), instituição que é referência em estudos de biologia tropical, orientaram alunos de graduação de Manaus, iniciando universitários na produção do conhecimento científico, tecnológico e de inovação. Parte da orientação foi remota para muitos, idas a campo e pesquisas em laboratórios foram limitadas nos últimos anos, por conta da pandemia da Covid-19. O desafio a mais ao fazer científico e ao estímulo à vocação de novos talentos acadêmicos, no entanto, não impediu o avanço do conhecimento na Amazônia, mesmo entre os que estão trilhando os primeiros passos.
Agora, chegou a hora de mostrar os estudos produzidos por bolsistas e orientadores das diversas áreas de pesquisa, desenvolvidos por meio do Programa de Iniciação Científica do Inpa, realizado em parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Pibic e Pibiti/ CNPq) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Paic/Fapeam). De 1º a 18 de agosto serão apresentados 161 trabalhos no IX Congresso de Iniciação Científica (Conic) e no I Congresso de Iniciação de Tecnologia e Inovação (Coniti) do Inpa, no auditório da Coordenação de Capacitação.
A Palestra de Abertura do evento conjunto acontecerá na segunda-feira (01), às 15h, no Auditório da Ciência. A renomada pesquisadora, a entomóloga Neusa Hamada, falará sobre a “História de uma bióloga na Amazônia”. Nascida no interior de São Paulo, Hamada é pesquisadora do Inpa há mais de 30 anos e é considerada a “Mãe dos insetos aquáticos” no Brasil, dada a sua excelência científica, capacidade colaborativa, formação contínua de mestres e doutores, além de atuar na socialização do conhecimento. A bióloga é pesquisadora 1 A do CNPq, nível mais alto de produtividade.
Ecologia de ninhos de tracajá
Um dos trabalhos de iniciação científica que será apresentado é o de Ewerthon Batista, estudante do 8º período de Ciências Biológicas da Universidade Nilton Lins. Ele estudou a ecologia de ninhos de tracajás (Podocnemis unifilis), na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Puranga Conquista, no baixo rio Negro. O tracajá é uma das 20 espécies de quelônios da Amazônia, com ampla distribuição geográfica ao longo de toda bacia hidrográfica da Amazônia e do Orinoco, sendo provavelmente a espécie mais comum da América do Sul. Ovos e carnes são apreciados pela população na maior parte da Amazônia, ameaças que se somam à predação de ninhos por predadores naturais.
O trabalho de Batista descreve aspectos biológicos da reprodução do tracajá, para entender melhor o comportamento de desova do quelônio na região, como o período de incubação, a taxa de eclosão dos ovos e o tamanho médio dos filhotes. O bolsista de Pibic (CNPq), vinculado às atividades do Centro de Estudos dos Quelônios da Amazônia (Cequa), passou vários meses indo a campo (setembro e outubro de 2021 e dezembro e janeiro de 2022) para encontrar e monitorar praias dia e noite na comunidade.
As rondas favorecerem encontrar mais ninhos, quase o dobro que em anos anteriores – passando de 12 para 23, e incubar mais de 500 ovos da espécie. Avanço também para as ações de conservação, já que o trabalho resultou numa quantidade maior de filhotes para manejo participativo de quelônios.
“No final do projeto, centenas de filhotes foram devolvidos à natureza em um evento comunitário de soltura de quelônios na região, em abril deste ano. Agora esperamos que a praia em que houve mais desovas possa ser permanentemente protegida, visando a conservação da espécie na RDS Puranga Conquista”, destacou Batista, que contou com apoio institucional e de colaboradores para realizar o trabalho de campo.
Um dos resultados científicos que mais chamou a atenção do bolsista foi o período de incubação dos ovos ter sido de 90 dias, maior do que de outras regiões de ocorrência da espécie, que normalmente varia de 65 a 70 dias. O período reprodutivo do tracajá varia ao longo da sua distribuição geográfica, podendo influenciar em diversas caraterísticas ecológicas e biológicas da reprodução da espécie devido às diferenças entre os rios e seus habitats.
“Pode ter sido uma particularidade deste ano, mas precisa ser melhor investigado com estudos e monitoramentos adicionais”, contou o estudante, que foi orientado pela pesquisadora Fernanda Werneck.
Valor da Ciência
O Programa de Iniciação Científica é muito importante para ensinar o valor da pesquisa para o estudante, que aprende desde fazer uma pesquisa bibliográfica, práticas de campo até escrever um trabalho científico. É uma oportunidade ímpar e muitos se identificam tanto que seguem para o mestrado e doutorado, contou a pesquisadora Liége Abreu, responsável pelo Laboratório de Entomologia da Madeira do Inpa.
Abreu Engenheira Florestal, especializada em Entomologia da Madeira, com foco em besouros e cupins xilófagos. A pesquisadora trabalha há 40 anos no Inpa e nesta rodada orientou o trabalho de Danilo da Silva Batista, que avaliou o tamanho da população de cupins da espécie Nasutitermes corniger. Este cupim constrói ninhos, colônias arborícolas, e estes foram coletados no campus 1 do Inpa, um fragmento florestal em área central de Manaus, e avaliados em laboratório.
O estudo avaliou cinco dos 20 ninhos identificados, com indivíduos variando entre 15 mil a 600 mil por ninho, alta variação que se explica pela formação de ninhos secundários, e a biomassa encontrada foi de 0.0291 g/m2 a 1.2674 g/m2 por ninho. A espécie se alimenta de madeira levemente apodrecida, e estudos futuros poderão indicar se a espécie apresenta potencial para ser praga.
Por Ascom Inpa