Festival Amazônia de Pé celebra povos e comunidades tradicionais e mobiliza contra o Marco Temporal, no Pará

Redação Planeta Amazônia

A segunda edição do Festival Amazônia de Pé vai celebrar a região que abriga a maior floresta tropical do mundo e uma diversidade de povos e comunidades tradicionais – os guardiões que mantêm a natureza viva. O evento será neste sábado (2), no Território Borari, Aldeia Alter do Chão, em Santarém. O line-up inclui a ribeirinha e mestra da cultura popular Dona Onete, além do grupo de carimbó de mulheres indígenas Suraras do Tapajós, a cantora afroamazônica Priscila Castro, a quilombola Cleide do Arapemã, o tradicional Espanta Cão e o Dj Zek Picoteiro. A entrada é gratuita e os shows serão transmitidos pelo YouTube, no canal do Amazônia de Pé. 

O Festival terá também os Botos Cor de Rosa e Tucuxi, de Alter do Chão; Lane Lima, guardiã tribal da Tribo Munduruku, do Festribal, realizado em Juruti (PA); e contará com a presença de Marciele Albuquerque – cunhã poranga do Boi Caprichoso, de Parintins, no Amazonas. E para completar, o público poderá visitar uma feira de produtos da sociobiodiversidade de organizações e coletivos da região do Tapajós e do Arapiuns. A realização é do movimento Amazônia de Pé, por meio da ong Nossas, e do Instituto Regatão da Amazônia – responsável pela concepção artística e curadoria musical. 

A grande novidade desta edição será a abertura com o rito do Sairé, manifestação religiosa e cultural do povo Borari, etnia indígena de Alter do Chão, e que completa em setembro 50 anos de realização. De acordo com Zek Picoteiro, do Instituto Regatão da Amazônia, curador do festival, o evento é uma forma de exaltar a estética musical do interior da Amazônia, conectada pelos rios.

o DJ Zek Picoteiro também é curador do festival/foto: Divulgação

“O Rio Tapajós é um afluente do Amazonas; o Arapiuns é afluente do Tapajós. E assim, as pessoas se conectam culturalmente através de festividades e matrizes culturais. Em Alter do Chão, é forte essa ligação de culturas pelos rios, que influenciam na vida do amazônida ribeirinho, indígena, quilombola. E isso vai se expandindo na Amazônia. Antes das grandes estradas já existiam os rios e era por lá que o tráfego de informações acontecia e ainda acontece. Vamos colocar no palco as sonoridades e expressões artísticas que fluem nas águas”, comenta Zek Picoteiro.


Para Helena Ramos, gestora de produção e cultura da ong Nossas, cultura é transformação social, e a valorização das expressões artísticas da Amazônia são formas de lutar pela conservação do bioma. “O Festival é uma ferramenta importante para falar sobre a defesa da região. É um festival de música, mas político, já que o movimento Amazônia de Pé também é contra o Marco Temporal e tem o objetivo de recolher assinaturas para o Projeto de Lei de Iniciativa Popular. Fazer o festival em Alter do Chão é uma forma de ecoar, a partir de lá, as ameaças à floresta para todo o país”, revela. 

Virada Amazônia de Pé


O Festival integra a Virada Amazônia de Pé, uma grande mobilização nacional em alusão ao Dia da Amazônia, celebrado em 05 de setembro. A programação terá ações em todos os estados, realizadas por grupos em defesa da Amazônia, como rodas de conversa, exibição de filmes, sarau cultural, apresentações artísticas e musicais. A ideia é sensibilizar cada vez mais a população brasileira para a apoiar a garantia dos direitos dos povos da Amazônia e a preservação do território, e apoiar ativistas e coletivos, em especial os da região amazônica, em sua mobilização por Justiça Climática, por exemplo. Confira programação completa em todo o país aqui.

Projeto de Lei de Iniciativa Popular 

A mobilização tem um objetivo: coletar 1,5 milhão de assinaturas de cidadãos brasileiros que possuam título de eleitor válido, requisito para protocolar o Projeto de Lei de Iniciativa Popular (Plip) que requer a destinação de 57 milhões de hectares de terras públicas não destinadas, ou seja, áreas da União que ainda não têm uma finalidade específica e são alvo de desmatamento acelerado e grilagem. A proposta é que essas terras possam ser demarcadas como unidades de conservação (UCs), Terras Indígenas, Territórios Quilombolas ou destinadas às comunidades tradicionais – povos que verdadeiramente conservam a Amazônia.

O PL chegou à versão final e foi escrito num processo de construção conjunta com os principais atores do projeto, por meio de entidades representativas como Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), Comitê Chico Mendes.

Não ao Marco Temporal!

O festival terá tom de protesto contra a tese do Marco Temporal, aprovada na Câmara dos Deputados enquanto PL 490, em maio, e que agora tramita no Senado como PL 2.903/2023. No Supremo Tribunal Federal (STF) a retomada do julgamento ocorreu na última quarta-feira (30). É uma proposta que viola o direito originário dos povos indígenas e pode impedir novas demarcações de Terras Indígenas, além de pôr em risco as já existentes. O texto em tramitação diz: “para que uma área seja considerada ‘terra indígena tradicionalmente ocupada’, será preciso comprovar que, na data de promulgação da Constituição Federal, ela vinha sendo habitada pela comunidade indígena em caráter permanente e utilizada para atividades produtivas”. 

Esse entendimento pode comprometer a biodiversidade, a vida dos povos originários e o nosso futuro, acelerando a crise climática. A aprovação da tese é um risco para a proteção da Amazônia e de diversos biomas, afinal as terras de povos indígenas são as mais protegidas. Dados do MAPBiomas apontam que nos últimos 30 anos, as Terras Indígenas perderam apenas 1% de sua área de vegetação nativa, enquanto nas áreas privadas a perda foi de 20,6%.

By emprezaz

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