(*) Por Joel Valerio
A atividade mineradora, sobretudo o garimpo ilegal de ouro e cassiterita, tem causado impactos devastadores nas comunidades amazônicas, com destaque trágico para o povo Yanomami. O que assistimos não é apenas uma crise ambiental — é uma crise humanitária, sanitária, cultural e espiritual.
As águas dos rios, antes fonte de vida, hoje estão envenenadas por mercúrio. Estudos recentes da Fiocruz e do Instituto Socioambiental revelam níveis alarmantes da substância no corpo dos indígenas. Essa contaminação não afeta apenas os Yanomami, mas se espalha pelas comunidades ribeirinhas e chega à periferia das cidades, comprometendo a segurança hídrica e alimentar de milhares de pessoas.
A presença dos garimpeiros acarreta surtos de malária, aumento da desnutrição e circulação de doenças infecciosas. O território Yanomami, já negligenciado historicamente pelo Estado, se vê ainda mais desamparado diante da atuação de criminosos armados, impedindo até mesmo o acesso de profissionais de saúde.
A cultura e o modo de vida tradicional também estão em risco. A presença constante de invasores impede a pesca, a caça, a roça. Os jovens são aliciados, os rituais sagrados interrompidos, o medo substitui o convívio comunitário. E neste novo ciclo do garimpo, dominado por facções criminosas, a violência se espalha como uma nova epidemia.
Apesar disso, as lideranças indígenas não se calam. O xamã Davi Kopenawa e organizações como a Hutukara e a Wanassedume Ye’kwana seguem denunciando os ataques e exigindo a retirada imediata dos garimpeiros. A força dessas vozes tem mobilizado o Ministério Público, organizações internacionais e setores da sociedade civil.

Mas isso não basta. É urgente que o Estado brasileiro assuma seu papel. Precisamos de ações contínuas de fiscalização, desintrusão e proteção territorial — não apenas promessas que mudam conforme o governante da vez. É preciso respeitar a Convenção 169 da OIT e garantir às comunidades indígenas o direito à consulta livre, prévia e informada.
A Amazônia não resiste sozinha. E os Yanomami não podem seguir gritando sozinhos. Ou a sociedade brasileira assume a defesa desses povos e territórios como um compromisso ético e civilizatório — ou nos tornaremos cúmplices da sua destruição.
(*) Fundador Presidente do Instituto Conviva