Foi inspirado no trabalho da indigenista acreana Neidinha Bandeira que o documentarista nova-iorquino Alex Pritz decidiu apontar suas lentes para um pequeno povoado indígena no interior de Rondônia. Antes disso, ele já havia mergulhado na história de uma aldeia de mineração soviética abandonada nas montanhas do leste do Quirguistão, na Ásia Central, em “My Dear Kyrgyzstan”, lançado há três anos.
Um dos principais nomes a levantar a voz contra o desmatamento e as queimadas criminosas na Amazônia há mais de 40 anos, Bandeira não quis ser o tema do documentário, mas enxergou a chance de potencializar a defesa de um dos povos mais fragilizados na batalha pela existência nas matas da floresta amazônica, os uru-eu-wau-wau.
“Quando conheci o povoado, entendi o quanto eles são importantes para a história que estávamos contando. Neidinha tinha uma relação próxima com eles, e seu papel na proteção da floresta não pode ser esquecido. Com pouco menos de 200 pessoas, os uru-eu-wau-wau estão defendendo a maior floresta de Rondônia, numa área de quase 18 mil quilômetros quadrados”, afirma Pritzi.
Assim nasceu “O Território”, documentário que estreia nesta quinta-feira (8) nos cinemas da capital paulista sob a direção de Pritz e a coprodução dos uru-eu-wau-wau. O povo, que já vinha documentando queimadas e invasões, viu no projeto uma chance de potencializar as denúncias do que ocorre no território com mais força nos últimos três anos, desde a eleição de Jair Bolsonaro, do Partido Liberal.
“Quando o governo Bolsonaro chegou ao poder, vimos muito rapidamente como isso afetou os povos indígenas e suas terras. A primeira invasão que acontece no filme ocorreu em 10 de janeiro, dez dias após a posse de Bolsonaro”, diz Pritz.
Produtora-executiva do documentário e colunista deste jornal, a ativista Txai Suruí acredita que o filme terá a chance de expandir não só as denúncias, mas os avisos acerca das questões ligadas à preservação ambiental que deram o tom de seu discurso na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas em 2021, a COP 26.
“É diferente eu contar uma história aqui e você ver a história acontecer. O cinema traz esse artifício visual, que tem mais poder. Estamos ultrapassando fronteiras e educando, porque quando falamos em crise climática não estamos falando só de árvores sendo queimadas, mas da vida das pessoas”, diz.
Vencedor de 16 prêmios internacionais, entre eles o do Festival Sundance, nos Estados Unidos, o filme ainda ganhará lançamento na Austrália e na Nova Zelândia nos próximos meses.
“Estamos vivendo num Brasil polarizado, e nossa produção mostra como as coisas são muito mais complexas. A maioria dos filmes tem o herói e o vilão, mas nós buscamos a humanização desses dois lados. A arte tem esse papel de união”, afirma Txai.