Sonaira Silva1, Lorena Regattieri2, Jessica Botelho3, Hemanuel Veras4
A Amazônia brasileira é uma das maiores florestas tropicais do mundo, com mais de 4 milhões de km2 e com uma população em torno de 30 milhões de habitantes, e é sempre notícia pela sua grandeza e biodiversidade, mas também pelo avanço desenfreado da destruição e degradação. Em torno de 20% da floresta foi desmatada e quase 38% da floresta que resta está em algum nível de degradação.
Na era atual das tecnologias de comunicação e informação, internet e inteligência artificial, a Amazônia vem ganhando destaque por conta da gestão da sociobiodiversidade e da potência articuladora dos territórios para o cuidado do bem comum. Entretanto, essa inserção é feita por quem e para quem? Essas são perguntas que devem ser feitas com maior frequência . Mesmo com os mais de mil veículos jornalísticos localizados na região, a produção de informações sobre a Amazônia é em grande maioria feita por veículos de comunicação fora da Amazônia e voltada para públicos fora da Amazônia. Essa situação, que enfraquece o conhecimento dos próprios amazônidas sobre a Amazônia em que vivem, e tornou-se ainda mais grave nos últimos anos com o enfrentamento da emergência climática, pois o jornalismo local enfrenta sérias dificuldades para informar sobre questões socioambientais e ainda abre espaço para desinformação.
Com a intensificação de eventos de chuvas intensas causando inundações recordes e, poucos meses depois, secas extremas, causando queimadas, incêndios florestais e crise de falta de água potável, o futuro do planeta depende de diálogos entre governos, sociedade civil, academia e atores que reconheçam os saberes de povos indígenas e comunidades tradicionais para manter a Amazônia viva. É preciso buscar continuamente caminhos e oportunidades para a resistência técnico-territorial contra a transformação da natureza em capital natural e a privatização da natureza e dos bens comuns em nome da inovação colonial, junto e para as populações locais.
Para tanto, a tecnologia da internet é primordial, entretanto gera enormes desafios sobre o seu uso, como a disseminação de notícias falsas e discursos monotemáticos sobre o melhor modelo de desenvolvimento econômico e modos de vida para a região. Um levantamento liderado pelo Coletivo Intervozes, mostra que há mais de 70 páginas/sites na internet que difundem diariamente notícias falsas e deturpadas ou mais conhecidas como fake news, que são impulsionadas propositalmente por aplicativos de mensagens como whatsapp e telegram, e que impactam diretamente a vida dos moradores que fazem a manutenção da floresta em pé .
Mesmo que a internet seja de má qualidade na Amazônia e a tecnologia 5G não tenha chegado, quase todas as famílias amazônicas têm um aparelho celular e conectam-se à rede regularmente, principalmente em aplicativos de mensagens. E nesta guerra de narrativas, quem perde são as populações que vivem na Amazônia, com a escassez do alimento (peixe, vinho como o açaí, castanhas, etc), ar limpo, matéria-prima para fazer casa, barco, cerca e tantos outros benefícios que a floresta traz todos os dias. A integração da perspectiva dos povos originários e comunidades tradicionais amazônicas com a sociedade regional e mundial pode auxiliar na garantia da representatividade de grupos sociais tradicionalmente mais vulneráveis às violências e violações de seus territórios, sobretudo para debater os caminhos para o fortalecimento democrático no Brasil e Amazônia, como oportunidade para construção coletiva da governança regional, garantindo a qualidade ambiental e adaptação aos eventos climáticos extremos.
No Brasil, o Projeto de Lei n° 2630, popularmente conhecido como PL das Fake News, é um bom exemplo de caminhos a serem seguidos. O PL busca regular e responsabilizar plataformas pelos riscos sistêmicos relacionados ao modelo de negócios das big tech, como a disseminação da desinformação que ameaça a sociedade e a democracia. Portanto, canais de notícias, divulgação científica e entretenimento na Amazônia devem ter como protagonistas os amazônidas, com suas formas de vidas, relações com a floresta e ambiente urbano, e acima de tudo, com informações verdadeiras e confiáveis. Em momentos diferentes, a guerra de poder e dinheiro matou pessoas que defendiam a Amazônia como Chico Mendes, Irmã Dorothy, Bruno Pereira e tantos outros que não tiveram seus nomes repercutidos nos meios de comunicação, meios esses que por vezes, propagam ódio e destruição.
É necessário que os amazônidas das cidades e da floresta se vejam nas notícias e informações que chegam até eles. Que a informação seja baseada em sua vivência do dia-a-dia, cheia de desafios e oportunidades como em qualquer sociedade. Que estes possam ser influenciados e influenciados por eles mesmos, sem que a guerra de poder e financeira moldem as discussões e decidam os seus futuros. Que a população da região possa reviver nossa ancestralidade amazônica em conciliação com a vida moderna em busca de um futuro para todos, na Amazônia e em todo o mundo.
1Universidade Federal do Acre/PPGCA 2Mozilla Foundation, 3Centro Popular de Comunicação e Audiovisual da Amazônia, 4Universidade Federal do Rio de Janeiro/PGCOM