E se o planeta Água secar?

Ricardo Assumpção (*)

Você já parou para pensar que a quantidade de água que temos atualmente é a mesma da era dos dinossauros? A diferença é a velocidade com a qual usamos (e desperdiçamos) esse recurso, que não permite tempo hábil para sua reposição ou reciclagem pela natureza. E embora não pareça, a falta d’água já é uma realidade: o Mapa de Risco Hídrico do Instituto de Recursos Mundiais (WRI, na sigla em inglês), de Londres, divulgado em agosto, relata que cerca de 4 bilhões de pessoas em todo o mundo enfrentam escassez de água.

E mais do que isso, o levantamento também mostra que, pelo menos em um mês do ano, quase metade da população mundial sofre de “estresse hídrico” e a previsão é de que esse número suba para 60% da população global até 2050. Como vamos viver sem água? Além de ser fundamental para vida, a água é elemento essencial para produção de alimentos, agricultura, manutenção da biodiversidade, pecuária, biomas mundiais e processos industriais.

Se no campo da tecnologia, os dados dos usuários podem ser considerados como o novo petróleo, não é exagero traçar um paralelo com a água, como um ativo extremamente valioso, considerando-a o novo ouro líquido. Especialmente nos dias de hoje, em que os debates e iniciativas de sustentabilidade estão cada vez mais presentes e necessárias e em que países, entes públicos e privados se reúnem anualmente para definir metas e iniciativas para reduzir o impacto do ser humano no mundo.

Quando falamos de Brasil, a estimativa do Plano Nacional de Segurança Hídrica (PNSH) aponta que, se não houver mudança de rumo, até 2035, cerca de 74 milhões de brasileiros devem enfrentar algum grau de dificuldade de acesso à água de qualidade. A crise hídrica na região Nordeste e na Amazônia já é uma realidade de um desafio nacional.

A disponibilidade hídrica de São Paulo é semelhante à do deserto. E não obstante, a captação de água para o abastecimento já chega a 160km. O que dá quase a distância da capital paulista até Campos do Jordão. Se você traçar uma linha imaginária no mapa na região de São Paulo. Temos desertos no Chile, na Austrália e na África. A gente só não tem um deserto aqui porque a corrente de vento traz água da floresta amazônica. Ou seja, a hora de agir já chegou. Vale ressaltar que a captação pode ser feita de duas formas: superficial, vinda de rios e lagos ou subterrânea, vinda de lençóis e aquíferos subterrâneos.

Por outro lado, estudos e projeções da FAO (Agência das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) indicam que o Brasil deve ser o maio produtor de alimentos do mundo até 2.030. Se tivermos água, é claro.

Se quisermos continuar, teremos que equalizar a questão da água já no curto prazo, seja nas atividades do dia-a-dia como nas grandes produções agrícolas e industriais. Apostar em reciclar, investir em circularidade e inovar podem ser os primeiros passos para essa nova realidade. Inclusive, uma empresa norte-americana criou uma cerveja feita com água de chuveiro reciclada.  A companhia de São Francisco instala um sistema de reciclagem de água nos edifícios, eliminando a necessidade de transportá-las para uma estação de tratamento remota. Com isso, o sistema recicla até 95% das águas residuais. Com dois mil galões de água reciclada, eles produziram mais de 7 mil latas de cerveja, com o objetivo educacional e não comercial.

Ainda podemos contar com a tecnologia, inteligência artificial, machine learning e diversas possibilidades como aliadas nessa causa. Em contrapartida, ao mesmo tempo que o tema exige atenção das iniciativas públicas, privadas e entidades civis, os movimentos já começaram. E o primeiro passo é o mais difícil. Uma pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra que nove em cada dez empresas industriais 89% adotam medidas para reduzir a geração de resíduos sólidos e 83% implementam medidas para otimizar o uso de água.

Para trazer essas urgências ambientais e climáticas à tona, a COP se faz extremamente relevante e necessária. Por mais que nessa edição o tema água tenha ficado um pouco à sombra dos holofotes centrais que foram para transição energética, no final das contas, tudo está interligado. Sem água, não tem transição energética, não tem floresta, plantação, indústria e nem vida. E para que a pauta da circularidade da água avance, precisamos ultrapassar duas barreiras: a regulatória e a cultural. Tem que regular e conscientizar a população. Chegou o momento de agir e descobrir como equalizar a disponibilidade hídrica entre sociedade e diversos tipos de indústria. É o agir hoje pensando no amanhã!

(*) Ricardo Assumpção é sócio-líder de sustentabilidade e CSO LATAM da EY

By emprezaz

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