Redação Planeta Amazônia
A noite cai em Taquaruçu, distrito da capital tocantinense, e pouco a pouco pessoas começam a se reunir nas cadeiras dispostas ao redor dos tambores de madeira, preparados para a queima que acontecerá durante a ocasião. É ali que, dentro de alguns minutos, o mestre Wertemberg Nunes começará a contar a história de uma prática que já dura há mais de 20 anos, e convidará os presentes a despejarem no fogo suas dores e preocupações.
Realizada como um rito pré-carnaval, a queima de tambores acontece em Taquaruçu desde 2002, sempre a uma semana antes das festividades. A atividade reúne a comunidade local, em um momento de consagração de novos instrumentos musicais, um resultado do processo de transformação e de purificação de troncos de madeira, raízes e sementes. Este ano, a celebração aconteceu no último sábado, 3, na Aldeia TabokaGrande. Antes do rito, os tradicionais bonecos gigantes, famosos na cultura popular local, saem pelas ruas do distrito a fim de convidar seus moradores de porta em porta.
“A queima dos tambores iniciou em 2002, dois anos depois de começarmos a sair com os bonecos gigantes. No ano seguinte, para fazer os tambores, a gente foi desenvolvendo um processo de como tratar a madeira, como fazer os tambores de Capoeboicongo. Tudo isso, toda essa semente foi lançada aqui e nasceu como é Palmas, que é um lugar de todos, de todo o Brasil, uma mistura de tudo. Foi mais ou menos assim que eu também cheguei e misturei”, contou o mestre Wertemberg.
O chamado Capoeboicongo é um ritmo que mistura três matrizes: capoeira, boi e congado. No início, segundo conta, saía com os bonecos pelas ruas, tocando com seus amigos em tambores que pegavam emprestados, já que ainda não sabia como confeccionar as peças no formato atual. Nessas ocasiões, um dos gêneros musicais mais populares entre os foliões durante as festividades de carnaval, o samba, foi substituído pelo Capoeboicongo, que viria a se tornar a base fundamental das manifestações dos bonecos gigantes.
Queimar os tambores, na verdade, consiste em queimar os troncos que virão a se tornar os tambores do ritmo, feitos artesanalmente a partir da madeira e do barro. O processo tem início quando são acesos os chamados Turimbó, troncos que servem como uma fornalha onde os tambores são modelados e afinados.
Durante o processo, a plateia é convidada a fazer pedidos de transformação ao jogar fora gravetos que, ao serem consumidos pelo fogo, simbolizam que algo ruim se transformará em algo bom. Este ano, Taiom Tawera, um dos quatro filhos do mestre Wertemberg, compartilhou com os presentes que desejava queimar no fogo do turimbó as inseguranças de todos aqueles reunidos na ocasião.
“Às vezes a nossa insegurança faz com que a gente dê muito valor e muita atenção ao que os outros falam sobre nós, esquecendo um pouco do que somos capazes de fazer, e acabamos nos impedindo de ter uma vida boa, uma vida plena”, disse ao fazer o seu desejo.
Ao contrário de Taiom, no entanto, outros espectadores preferem fazer os seus pedidos em silêncio, pedindo ao fogo que leve seus medos, angústias, dores e preocupação para longe, substituindo-as por algo positivo. E assim, há mais de duas décadas, o fogo segue renovando e acalentando os corações daqueles que acompanham a já tradicional Queima dos Tambores de Taquaruçu.