Redação Planeta Amazônia
O trabalho artesanal é, por muitos, pensado como um passatempo, mas na verdade é uma atividade profissional rentável que é a base para diversas famílias do país, e um ofício que é muitas vezes passado de pai para filho. Segundo dados de 2022 do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), o Brasil possui cerca de 8,5 milhões de artesãos. No Tocantins, de acordo com o Programa do Artesanato Brasileiro (PAB), são mais de 1900 profissionais registrados no sistema de cadastro nacional. Somente em 2023, o Governo do Estado, por meio da Secretaria da Cultura (Secult), já produziu cerca de 600 novos cadastros, colaborando para a regularização e o desenvolvimento da atividade manual.
Visando o fomento e a expansão do artesanato produzido por profissionais do Tocantins, a gestão tem buscado investir na participação de artesãos locais em feiras nacionais, que alcançam não apenas compradores de outros estados, mas compradores internacionais, que participam dessas feiras buscando a diversidade do artesanato brasileiro, levando-o a alçar novos voos fora do país.
Participando de feiras desde 2008, Eliene Bispo é presidente da Associação Dianopolina de Artesãos e já esteve em estados como o Rio de Janeiro, Minas Gerais, Pernambuco, Santa Catarina, entre outros, levando o artesanato produzido em capim dourado no seu município. Segundo a artesã, participar de feiras é uma oportunidade para expandir clientes e apresentar o trabalho desenvolvido por ela e os membros da associação a qual representa. Em 2023, a entidade participou e foi selecionada nos três editais abertos pela Secult, estando presente na Feira Nacional de Negócios do Artesanato (Fenearte), em Olinda (PE), na Feira Nacional de Artesanato e Cultura (Fenacce), em Fortaleza (CE), e no 16º Salão do Artesanato, em Brasília (DF).
“As feiras são uma oportunidade de mostrar nosso trabalho e apresentar para pessoas de outros lugares. Mesmo que seja uma feira em que as vendas possam não ter sido tão boas presencialmente, muitas vezes após ela, você recebe encomendas que superam a feira em si, feitas por pessoas que conheceram seu trabalho lá”, explica.
Durante sua participação na Fenacce, Eliene foi uma das artesãs selecionadas pela curadoria da feira para a rodada de negócios, o que possibilitou o contato com compradores internacionais. Na ocasião, ela fechou um contrato de dois anos com uma compradora chinesa e o trabalho já começou a ser enviado àquele país. “Tivemos uma conversa durante a rodada e depois ela me enviou o contrato para que eu pudesse analisar e assinar. Em seguida, já fez um primeiro pedido e está mantendo o contato direto”, diz.
Aproveitando o espaço e a visibilidade que a exposição de peças em feiras nacionais proporciona, artesãos selecionam seus trabalhos e, junto a equipe da Secult que os acompanha a cada edição, dispõem e organizam cada peça cuidadosamente no ambiente, decorando-o e possibilitando que cada visitante possa ter ideias criativas ao entrar no estande. Esse trabalho de organização é sempre feito no dia anterior à abertura de cada feira, um momento de excitação e ansiedade para o que virá em seguida.
“Quando participo de feiras pego um pouco de cada trabalho que tenho para expor. Levo praticamente de tudo, na verdade, só que ultimamente, eu estou selecionando muito mais, sendo mais criterioso no que eu vou produzir. A gente vai ficando mais seletivo com as peças com a nossa experiência de vida. Eu sempre busco fazer ou criar alguma coisa nova, que não seja aquela peça básica. Acrescentar um detalhe estético, criando um design novo, uma forma nova”, diz o artesão Emerson Leitão, do município de Gurupi, que trabalha com materiais como madeira e pedra sabão.
Feiras Nacionais
O artesanato produzido no Tocantins se destaca por sua diversidade de linguagens e a riqueza da biodiversidade da região. Matérias-primas como o capim dourado, a madeira, o jatobá, as palhas e fibras de buriti e de bananeira, o barro, entre outros recursos, se transformam em acessórios de uso pessoal, peças utilitárias e de decoração, que tornam qualquer ambiente mais vivo e criativo.
Em 2023, as vendas do artesanato tocantinense em feiras nacionais superaram o ano anterior, o que demonstra o investimento neste setor e o crescimento do interesse do público pelo trabalho desenvolvido por artesãos locais. A última participação de profissionais do Estado em feiras este ano, promovida pela Secretaria da Cultura, através do PAB, foi no 16º Salão do Artesanato, que aconteceu em Brasília, entre os dias 15 e 19 de novembro. A feira trouxe um saldo de R$ 85.467,00, com 2.784 peças vendidas e encomendadas, superando os R$ 82.290,00 obtidos em 2022. O crescimento também pôde ser observado nas vendas realizadas durante a Fenacce e a Fenearte, com R$ 219.129,00 e R$ 280.481,00, respectivamente, valores que superam os saldos do ano anterior.
Para a superintendente de Fomento e Incentivo à Cultura, Kátia Maia Flores, “o artesanato do Tocantins gera renda e qualidade de vida para uma parcela muito grande do povo tocantinense. Ele emprega pessoas, principalmente mulheres que têm suas vidas transformadas através do trabalho artesanal”, diz.
Em visita ao estande do Estado na última edição do Salão do Artesanato, o ministro do Empreendedorismo, da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, Márcio França, reforçou a importância da criação do ministério para o auxílio dos profissionais do setor. “No Brasil todo são mais de 400 mil pessoas, famílias que vivem do artesanato, e a gente está muito contente que o presidente Lula criou o ministério para poder acompanhar e ajudar essas pessoas, que são trabalhadoras e artistas”, frisou.
Histórias de vida e criatividade
Além do talento, da criatividade para a concepção de ideias e da paciência para o manejo e modelagem de peças, o ofício de artesão também envolve muitas histórias. Dona de uma arte feita a partir da fibra de bananeira, a artesã Elenice Dias da Silva, que atua em Palmas, lembra que seu interesse pelos trabalhos manuais começou ainda quando criança.
“Na infância, eu fazia as panelinhas para brincar porque não tinha oportunidade de ter brinquedo. Então, eu aprendi a fazer esse trabalho quando criança, mas só agora, há mais ou menos uns 5 anos, que comecei a ver como algo que poderia comercializar, que poderia gerar uma renda. Hoje em dia, faço cestas para colocar pão, fruteiras, cestos para roupa suja, panelinha, jogo de café, jogo americano, entre outros”, explica.
Elenice conta que costura seu material com uma agulha que ela mesma produz, reaproveitando materiais que muitas vezes as pessoas querem jogar fora. “A agulha é feita a partir do ferro das sombrinhas. Eu corto com alicate, lixo e faço. Meu marido me ajuda a tirar o material das bananeiras. Quando o cacho é cortado, é cortado também o pé para jogar fora, e aquele pé eu aproveito para o meu trabalho. Cada peça é feita com muito amor e carinho, algo que é bem trabalhado com as mãos e que envolve muita paciência”, diz.
José Guimarães, do município de Ananás, desenvolve seu trabalho com jatobá há cerca de 15 anos. A matéria-prima é utilizada para a produção de bonecos, que com ele viajaram para cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e Florianópolis, retratando histórias da vida rural.
“Gosto de trazer cenas do cotidiano no meu trabalho, retratar e falar sobre os agricultores que usavam a enxada, das dificuldades que enfrentavam. Hoje, o pessoal trabalha também com máquinas, muitos não usam mais essas ferramentas, mas ainda há pessoas que usam essa técnica. Eu tento retratar essas cenas do cotidiano do homem da roça, da vida rural”, disse.
Com uma imensa variedade de profissionais e estilos de se fazer arte, o artesanato do Tocantins é um reflexo do contato das diferentes culturas que formam o Estado, das exuberantes fauna e flora do Cerrado brasileiro, da criatividade e da resistência de um povo que tem sua natureza, suas vivências, seus arredores e suas histórias como principal fonte de inspiração.